Justiça proíbe plantio de soja transgênica no entorno da Serra de Bodoquena
Decisão reafirma proteção ambiental e rejeita pedido de empresa para cultivo próximo ao Parque Nacional.
| JHEFFERSON GAMARRA / CAMPO GRANDE NEWS
O juiz Guilherme Vicente Lopes Leite, da 4ª Vara Federal de Campo Grande, negou o pedido para plantar soja transgênica em uma área de 115 hectares localizada na zona de amortecimento do Parque Nacional da Serra de Bodoquena. Na sentença, proferida no início de novembro, o magistrado ressaltou a necessidade de proteger o ecossistema da região, ainda que não haja certeza científica sobre os potenciais danos ambientais, aplicando o princípio da precaução.
Um juiz federal negou um pedido para o plantio de soja transgênica em área próxima ao Parque Nacional da Serra da Bodoquena, em Mato Grosso do Sul, aplicando o princípio da precaução devido à incerteza sobre os potenciais danos ambientais. Apesar da demora na desapropriação de terras privadas dentro do parque, o juiz manteve as restrições ambientais, argumentando que a proteção da unidade de conservação prevalece sobre interesses econômicos e que a ausência de desapropriação não invalida as leis ambientais vigentes. A decisão reforça a importância da preservação do ecossistema do parque e a aplicação de medidas de proteção ambiental, mesmo com a falta de comprovação científica definitiva sobre os impactos dos transgênicos.
O Parque Nacional da Serra de Bodoquena, criado por decreto federal em 2000, é uma unidade de conservação que abrange mais de 76 mil hectares nos municípios de Bonito, Jardim, Bodoquena, Miranda e Porto Murtinho. Apesar de ser considerado um dos mais ricos ecossistemas do Pantanal, a implementação total do parque enfrenta desafios, incluindo disputas judiciais sobre a desapropriação de propriedades privadas inseridas dentro e ao redor da unidade. Propriedades que deveriam ser indenizadas ainda permanecem sob domínio particular, mas, segundo a Justiça, isso não afasta as limitações impostas por leis ambientais.
O caso envolveu uma área cedida por comodato à empresa autora, que argumentava que a proibição do cultivo de organismos geneticamente modificados na faixa de 500 metros da zona de amortecimento seria desarrazoada, por não se basear em estudos técnicos claros. A defesa sustentou que, na ausência de comprovação científica definitiva sobre danos ambientais, a atividade agrícola nos limites da propriedade deveria ser autorizada.
O juiz rejeitou os argumentos e reafirmou a validade das normas que regulamentam o uso da terra no entorno do parque, incluindo o Decreto nº 5.950/2006 e o Plano de Manejo da unidade. Ele citou o laudo técnico produzido pela perita Cláudia Bittencourt Brandão, que apontou os impactos ambientais potenciais do cultivo de transgênicos. “Um dos principais impactos negativos relacionados aos OGMs é o potencial de cruzamentos genéticos com plantas nativas ou culturas convencionais, de forma que a propagação não controlada dos genes modificados por meio do pólen pode ter implicações expressivas para a integridade dos ecossistemas e da diversidade biológica', destacou a perita.
Ainda segundo o laudo, a presença de genes transgênicos em áreas não planejadas pode resultar na diluição da diversidade genética de populações naturais. Diante disso, o magistrado reforçou que a proteção ambiental deve prevalecer sobre os interesses econômicos em casos de incerteza científica: “Ainda que não haja certeza sobre os supostos danos ambientais a respeito do cultivo de organismos geneticamente modificados, conclui-se em favor da proteção ao meio ambiente', pontuou o juiz.
A decisão também tratou de outra disputa relacionada ao parque: a ausência de indenização aos proprietários de terras inseridas dentro dos limites da unidade de conservação. O decreto de criação do parque previa que as áreas particulares seriam desapropriadas em até cinco anos, mas, passadas mais de duas décadas, a maior parte dessas terras ainda não foi transferida para o domínio público.
Os autores da ação argumentaram que essa demora seria motivo para extinguir as restrições ao uso das áreas. No entanto, o juiz discordou, afirmando que as limitações ambientais e sociais previstas em lei continuam vigentes, mesmo diante da falha do poder público em concluir as desapropriações. “O fato de o Poder Público ainda não ter efetivado a desapropriação dos imóveis incluídos dentro da abrangência do Parque Nacional da Serra da Bodoquena não significa que os proprietários possam fazer uso incompatível do espaço', escreveu o magistrado.
O magistrado destacou que a proteção da unidade de conservação é um ato consolidado e só pode ser alterado por lei formal, conforme previsto na Constituição. “A ausência de desapropriação das áreas particulares que integram o parque não impõe a caducidade do decreto que criou a referida unidade de conservação, pois sua essência preservacionista é incompatível com uma exploração desordenada', afirmou.
Com isso, o juiz julgou improcedentes os pedidos da empresa e determinou a extinção dos processos relacionados, reafirmando a validade das medidas de proteção ambiental implementadas pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e pelo Ibama. A empresa foi condenada a arcar com os honorários advocatícios, fixados em 10% do valor da causa.
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